terça-feira, 16 de outubro de 2012



Os caminhoneiros, responsáveis por cerca de 60% do transporte de cargas no Brasil, ganharam as manchetes nas últimas semanas. No fim de julho, o Movimento União Brasil Caminhoneiro – MUBC – convocou uma paralisação geral da classe em protesto contra Lei n° 12.619 do Código Brasileiro de Trânsito. A chamada "lei do descanso" regulamenta a jornada de trabalho dos motoristas e impõe limites às horas ao volante na tentativa de dar mais segurança e conforto ao caminhoneiro. Com ela, os motoristas são obrigados a parar para descansar durante as viagens sob pena de multa caso a jornada exceda o tempo previsto em lei. Mas, mesmo com a proposta aparentemente benéfica, a "canetada" esbarra na dificuldade operacional de seu cumprimento, o que originou novas reinvindicações e uma greve que parou as principais rodovias federais das regiões Sul e Sudeste.

A entrada em vigor da Lei, em 30 de abril de 2012, junto com o início da fiscalização no início de agosto, levantou um debate para o problema vivido pela logística do transporte rodoviário brasileiro. Caminhoneiros que trabalham sem descanso, o preço baixo dos fretes e a má qualidade das rodovias federais são as principais dificuldades relatadas. "Toda lei gera polêmica no início e depois precisa de ajustes. Essa não deve ser diferente, cujas sanções e vetos devem ser reanalisados posteriormente para adaptar melhor à realidade das estradas", completa Newton Gibson, presidente da Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga.

A Lei exige que o caminhoneiro contratado – por alguma transportadora ou cooperativa – trabalhe até 10 horas por dia, com 8 horas contratuais e no máximo duas horas extras. Além disso, a cada 4 horas de viagem, ele deve fazer uma parada de no mínimo 30 minutos para descanso. Para os caminhoneiros autônomos – 46% do total de registros, segundo a Agência Nacional de Tranportes Terrestres, ANTT –, a diferença é que a jornada diária pode se estender às 12 horas trabalhadas, mas com a mesma rotina de paradas ao longo do dia. O problema é que isso esbarra na questão financeira. "O caminhoneiro não tem condições de trabalhar ’apenas’ oito horas por dia, sob pena de não receber pelo frete entregue fora do prazo", explica o presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos do Sul Fluminense, Francisco Bittencourt.

A limitação da carga horária tem como objetivo retirar das estradas profissionais cansados, forçados a rodar em função de prazos apertados e rotinas que superam as 16 horas ao volante por dia. O Governo espera assim, diminuir sensivelmente os acidentes nas estradas federais causados por motoristas sem condições mínimas de se manterem no comando de um caminhão. No entanto, segundo o Sindicato dos Transportadores Autônomos de São Paulo – que é a favor da nova regulamentação –, o cumprimento da lei ficou complicado depois do veto da presidente Dilma Roussef ao artigo que obrigava as concessionárias responsáveis por rodovias privatizadas a construir novos postos de parada. Procurada, a ANTT não se posicionou sobre os problemas. 

O problema é que a menor carga horária diária pode limitar a rentabilidade – que já é baixa – principalmente dos autônomos. Já que muitos acabam pegando diversos fretes, com jornadas grandes, exatamente para conseguir o mínimo para a sobrevivência. Assim, ao se encaixarem nos novos moldes, a maioria dos profissionais teria o seu resultado reduzido. "O número de empresas transportadoras quase dobrou no período entre 2007 e 2011, o que acirrou demais a competição e derrubou o valor do frete. Muitas vezes, a viagem sequer compensa os gastos com combustível", explica o especialista em transportes de cargas José Augusto Dantas, que atuou no setor de varejo por mais de 30 anos e da Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transporte.

Para tentar pressionar o Governo a revisar as novas medidas, a categoria estima que o preço do frete fique até 20% mais caro, o que afetaria o preço de praticamente todas as mercadorias transportadas por caminhão. Além disso, bloqueios montados nas principais rodovias do país, como a Presidente Dutra – que liga Rio de Janeiro e São Paulo – e a BR-101, no Espírito Santo, fizeram o problema ganhar a atenção do Ministério dos Transportes. "O ministro dos transportes reuniu os representantes da MUBC e do Unicam para tentar resolver o impasse e liberar as rodovias", conta Pedro Sardinha, assessor do Ministério dos Transportes. Em pauta, as reivindicações do MUBC, que apesar de representar uma minoria, conseguiu a atenção requerida com o caos nas rodovias federais.

Até agora, a única mudança feita de imediato na Lei n° 12.619 foi a concessão de mais 30 dias para a adaptação dos caminhoneiros e transportadoras à nova regulamentação. Até 11 de setembro desse ano, a fiscalização será apenas de caráter educativo, sem punições aplicadas – que serão de R$ 127 por infração e cinco pontos na carteira quando a lei começar a valer. A partir do dia 8 de agosto serão feitas novas rodadas de negociações com as entidades governamentais competentes – como a ANTT e os Ministérios do Trabalho e da Fazenda – a cada reivindicação do MUBC, de modo a tentar resolver o impasse.

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